Em ilusão

Tens-me elevado. Mas quem és tu? De quem escrevo? Para quem escrevo? Será para ti que lês? Será para ele, que vive livremente, sem sequer pensar que eu existo?
Tens-me elevado. E eu escrevo. Escrevo, porque escrever equilibra-me nestes dias, em que estou desiquilibrado, em que é mais forte a vontade de correr as noites, de silenciar o mundo, calar o que se pensa. Tens-me elevado, mas mesmo assim, não elevas a alma, a ponto a que ela não se feche, para que ela não se deseje escuridão e posterior esquecimento. Tens-me feito bem, mas eu não consigo sobrevoar essa floresta negra, tão negra, sem ter que percorrê-la - dor e amargura, escolho caminhar pelas ruas da minha cidade, enquanto se eleva a escuridão dentro de mim, a névoa que te envolve. Prefiro percorrer a minha aldeia, a mata, a conhecer. A conhecer gente nova, a dar de mim a gente nova. Prefiro o silêncio do cemitério, à força infindável desse olhar, ao bater do teu coração. Ou do coração dele? Ou ao coração de quem quer que seja?
As horas passam e a minha imaginação deleita-se em ti, nos teus traços.
Fumo um cigarro e deixo fluir a imaginação.
Sabes? Tens elevado qualquer coisa de boa em mim. Não sei o quê, mas há sempre algo de bom e enternecedor nesse teu jeito - e eu serei sempre uma criatura de sombras, de trevas, alimentando-me da noite. Serei sempre a criatura esquiva, saída das trevas para se alimentar.
Acendes uma vela. Aroma de incenso. E eu percorro os corredores da noite, qual assombração, imaginando-te por aí.
Escrevo. Escrevo para mim, em jeito de devaneio, sem que saiba a quem se destinam as palavras ternas. A noite assoma-se ao meu peito e eu tremo de ilusão. E é em ilusão que me encontro - sem me perder.

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