Ausência

Dir-se-ia adeus a uma vida inteira? Adeus a uma vida inteira de pequenas verdades, de pequenas mentiras, de pequenos momentos, de pequenos objectos? Dir-se-ia adeus a uma vida inteira de sorrisos e de lágrimas, de sangue e de suor, de carinho e de ódio? Dir-se-ia adeus a uma vida inteira a troco de quê?
Eu sonho e ambiciono mais. Mais verde, mais campo aberto, mais montes, mais estrelas no meu céu, mais silêncio, mais solidão, mais afastamento, mais distância. Eu sonho e ambiciono mais de mim, mais da ausência, mais da minha frieza e mais da minha amargura.
Longe daqui, das ruas povoadas de estranhos selvagens, da cidade que amo e com a qual me identifico cada vez menos. Longe de todos quanto amo, próximo da minha terra, da minha raíz. Onde ainda se fala o Português que tanto amo. O meu amor é a minha terra, o meu amor é a minha pátria, o meu amor é a minha língua - fúteis vaidades para alguns, imensa verdade para mim.
Estender-me-ei no meu campo. Serei uma árvore tocada pela vento, "abrindo os braços ao céu, como um crente". Serei a pedra da calçada que todos pisam ou de uma terra ao abandono. Serei tudo, tudo o que sentirem e tudo o que tocarem. Serei aquele gostinho amargo na boca, de um amor que terminou, o vento que leva as lágrimas de desgosto, a pedra da sepultura. Serei tudo sem ser nada. E serei feliz. Serei amarguradamente feliz.

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