Pensamentos da insónia

Deveria estar a dormir, mas tenho atravessado as minhas noites assim: fumo, fumo bastante, ouço música e chafurdo na depressão. Na minha cabeça, estou em frente ao mar num dia gelado, com bastante vento, embrulhado numa espécie de um xaile capa que arrasta as areias e esvoaça com o vento, o capuz na cabeça, enquanto largo uma prece silenciosa. Já não choro, não obstante a vontade.

Estou só. Escuridão no quarto, interrompida pela luz do ecrã do telemóvel de onde escrevo este texto.

Este ano tem sido o que se chamaria de uma bela merda. Mas não é daquelas merdas sem sentido que vou sentindo. Também não tenho escrito; passei o sofrimento no silêncio e nem nos meus diários escrevo sobre a morte que se abateu em minha casa, nem sobre os pensamentos suicidas que equaciono, nem sobre o vazio em que caminho, já despojado de luz ou alegria. Não tenho escrito, nem para o bem da minha parca sanidade mental, nem para o despojo das mágoas que me consomem.
Estou só. E como em todos os piores momentos da minha vida, permaneço só e firme na decisão de que nada deve abalar esta solidão.
Se deveria estar a dormir ou a acordar, firme é a certeza de que não sei mais o que é uma rotina, de vida ou de sono, exceptuando a que ganhei ao regressar aos estudos. Se deveria estar a dormir, certo é que estou acordado, com essa música a tocar nos fones do telemóvel, enquanto a luz do telemóvel irrompe pela escuridão. No meu peito, uma tristeza como nunca ousei imaginar que pudesse ser sentida, um vazio como se o meu coração tivesse sido consumido. Se deveria estar a dormir, talvez devesse estar morto.

Olho para trás. Há tantos momentos que me vêm à memória e que parecem mortos, como os mortos que lamento e relembro, uma e outra vez.
Esta vida é um nunca mais acabar de mágoas, mortes e funerais. Optimistas haverão que dirão que tem que avançar-se e que a vida não pára. Não pára, realmente, mas quem é que faz com que avance? Quem é que me tira deste poço sem fundo, no qual caio contínua e ininterruptamente? Quem, além dos óbvios, se preocupa sequer? Admiram-se, as pessoas, que eu tenha um ódio generalizado pela humanidade: um simples elogio e brincadeira é "abuso", mas receber porno dos outros já é na boa; temos muitos amigos, muito ocupados e nunca podem estar, mas já têm tempo para os outros; temos quem saiba do que se passou na minha vida e ignore completamente a minha existência. No fim de contas, temos muitos amigos e não temos ninguém: poderia morrer e desaparecer, poucos seriam reais, honestos, verdadeiros... De todos os que, hipoteticamente, aparecessem no meu funeral, apenas uma mão cheia deles seria real e verdadeiro no seu luto.

Amanhã (mais logo) é um outro dia em que seguirei na mágoa e no desprezo. Outro dia, apenas, em que memórias avassaladoras esmagar-me-ão e em que a ideia da morte, as lembranças de antes e dos últimos meses farão tormenta dentro de mim, enquanto muitos me desprezam, porque já não precisam ou não querem saber, porque não sirvo os seus propósitos ou porque se ofendem com uma conversa, enquanto normalizam o envio de porno. E ainda se admiram porque não gosto de muita gente, porque não confio em praticamente ninguém.

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